Teorias linguísticas posteriores a Ferdinand de Saussure

Nem só de Saussure vive a linguística. O estudante que começa aprender linguística e tem que aprender as dicotomias de Saussure (como langue e parole, sincronia e diacronia, significante e significado) muitas vezes fica com a impressão de que as posições de Saussure correspondem às posições adotadas por toda a linguística e por todos os linguistas.

Mas isso não é verdade. A importância de Saussure foi delimitar de modo muito mais claro várias possibilidades diferentes nos estudos da linguagem. Ele defendeu certas abordagens ao invés de outras. Muitos linguistas adotaram posições semelhantes às dele, mas, com o tempo, adaptaram tais posições, modificaram e, eventualmente, até se opuseram.  A importância de Saussure é que, muitas vezes, até teorias muito diferentes das ideias dele precisaram se posicionar com relação aos conceitos que ele desenvolveu.

Aqui, eu apresento de modo bastante resumido as características principais de quatro teorias que surgiram nos estudos linguísticos depois de Saussure.

Se preferir, você pode ver o vídeo que eu fiz a esse respeito:

 

ESTRUTURALISMO(S)

Abrange várias teorias ou grupos teóricos diferentes, com conceitos e métodos ligeiramente distintos, mas que costumavam concordar em alguns pressupostos gerais muito semelhantes às ideias de Saussure:

(i) língua como estrutura, entendida como rede de relações;

(ii) distinção entre sincronia e diacronia e preferência pela sincronia;

(iii) distinção entre língua (estrutura) e fala;

(iv) ênfase nos aspectos internos à língua e não na história social e cultural externa;

(v) ênfase nas peculiaridades de cada sistema linguístico e não em universais linguísticos. Foco maior na fonologia e na morfologia; em menor escala, na semântica lexical.

[Sobre o conceito de estrutura no estruturalismo, confira aqui: youtube | odysee]

Algumas subdivisões e alguns nomes relevantes:

– Roman Jakobson, Nikolai Trubetzkoy e Vilém Mathesius (Círculo Linguístico de Praga);

– Leonard Bloomfield e Edward Sapir (estruturalismo americano);

– Antoine Meillet, Émile Benveniste;

– Joaquim Mattoso Câmara Jr (considerado primeiro linguista brasileiro,

associado ao estruturalismo americano);

– Louis Hjelmslev (Círculo Linguístico de Copenhague).

Teorias surgidas a partir dos anos 1960 em reação e substituição ao estruturalismo…

 

GERATIVISMO

Desenvolvida por Noam Chomsky, essa teoria analisa a língua como objeto mental, como uma competência linguística ou gramática internalizada, que explica a criatividade do falante: capacidade de produzir e interpretar todas as frases da sua língua, mesmo as que nunca ouviu falar.

Opõe-se à concepção de língua como comportamento externo (adotada pela vertente americana do estruturalismo). Assume também que a linguagem tem base genética, com todas as línguas sendo fruto de uma Gramática Universal inata.

À primeira vista, o conceito gerativista de “gramática internalizada” se assemelha ao conceito de langue/língua de Saussure, por ser um sistema de possibilidades abstratas no cérebro do falante, mas o gerativismo enfatiza muito mais o aspecto individual dessa realidade. É o conhecimento da língua que o falante internalizou e faz parte da sua psique. Não é uma realidade supra-individual,  social, coletiva.

O foco do gerativismo está na comparação entre as línguas e universais linguísticos. Foco na estrutura sintática ou morfossintática.

[Sobre a diferença entre Gramática Universal e gramática internalizada, confira aqui: youtube | odysee]

 

SOCIOLINGUÍSTICA

Associada principalmente a William Labov, foca na tentativa de compreender o mecanismo da mudança linguística: não apenas em apontar que mudanças aconteceram, mas como elas ocorrem. Para isso, estuda a variação sincrônica, buscando os fatores estruturais e principalmente sociais que influenciam as escolhas linguísticas do falante.

Analisa a mudança através de dados sincrônicos, negando a separação estrita entre sincronia e diacronia. Foco no vernáculo, a fala com menor grau de monitoramento.

Assume que o sistema linguístico é intrinsecamente heterogêneo. Outros nomes: sociolinguística variacionista, sociolinguística quantitativa, teoria da variação. Foco maior na variação fonética e, em menor grau, na variação sintática.

[Sobre o conceito de vernáculo, confira aqui.]

 

FUNCIONALISMO

O Círculo Linguístico de Praga, do estruturalismo europeu, costumava ser chamado de “estruturalismo funcional” ou “funcionalismo”, mas hoje o termo se refere a teorias não-estruturalistas, que rejeitam a separação entre sincronia e diacronia, bem como entre língua e fala.

Tem o foco no uso da língua como meio de interação social, descrevendo uma competência comunicativa. A fala é que criaria a estrutura linguística (se é que existe estrutura linguística).

Adota uma abordagem pancrônica, assumindo que fatos sincrônicos podem ter explicações diacrônicas. Busca explicar universais linguísticos como fruto de propriedades não linguísticas, como universais comunicativos. Foco nas motivações pragmáticas para a morfossintaxe.

[Sobre a concepção de mudança linguística no funcionalismo, confira aqui.]

 

OUTRAS TEORIAS:
(i) linguística textual (“texto” no sentido de sequência linguística maior do que a frase, seja oral ou escrita).

(ii) linguística cognitiva (ou semântica cognitiva).

(iii) semântica formal.

(iv) teoria da otimalidade (foco na fonologia).

(v) análise do discurso (embora possa ser considerada como uma área diferente da linguística; influência da linguística, da psicanálise e da teoria marxista).

Etc.